O que faz este caso especial é o fato de pelo menos um dos envolvidos (eu) fazer todas as concessões possíveis e impossíveis para o relacionamento prosperar e mesmo assim sem alcançar o resultado positivo que tantos almejam. Não porque a parceira fosse uma daquelas que “pisa” quando sabe que seu parceiro está na mão dela. Não. Muito pelo contrário. Dei essa “moral” conscientemente, pois sabia que era digna de merecimento. Aliás, ainda sei que é.
Antes de prosseguir, um pouquinho do meu histórico de perfil. Desde que construí minha identidade, por volta dos 27 anos, me defini como solteiro convicto e militante! Cheguei até a tentar fazer vasectomia para diminuírem as chances do meu estilo de vida não mudar e meus objetivos pessoais/profissionais serem alcançados. Contudo, um detalhe me diferenciava. Eu era o solteiro convicto “honesto”, super sincero. Ou melhor, não enganava e nem dava falsas esperanças às minhas parceiras. Dizia o que eu queria com todas as letras para não ter dúvidas - sexo, amizade sincera e diversão.
Eis que, um belo dia, por uma série de circunstâncias, resolvi retribuir o carinho, amor, comprometimento e lealdade à mulher que estava comigo naquele momento. Não foi uma daquelas paixões forte que me fez rever todo o meu discurso e que mais tarde se tornou motivo de chacota entre meus amigos. Eu já havia me apaixonado diversas vezes. Não me afastava de paixões por medo, como alguns “falsos solteiros convictos” fazem. Mesmo porque eu acreditava muito nas minhas convicções e achava que nada poderia abalar - e nunca abalou. Novamente para lembrar: foi uma série de motivos que formavam uma situação perfeita!
Duas pessoas numa idade madura (38 anos), sem filhos, profissionalmente encaminhados, incrivelmente apaixonados e com o apoio das duas famílias! Uma verdadeira raridade. Além do comprometimento natural da fidelidade – a única imune a tentações do cotidiano. Como eu disse - perfeito.
Agora, você deve estar se perguntando: porque que um ateu está compartilhando um caso amoroso, íntimo e de forma melosa, num texto sobre mídias sociais? Foi necessário eu contextualizar a situação primeiramente, para minha hipótese ganhar força.
Até aqui, tudo lindo e maravilhoso. Casamos (não no papel - moramos juntos). Durou 7 meses. Mas garanto que o motivo da separação não é o que você está pensando. Não foi:
- Dificuldade de convivência;
- Saudade da vida de solteiro e suas aventuras;
- Liberdade;
- Pego com outra(o);
- Invasão de privacidade;
Nada disso. Acreditem.
O motivo principal foi dinheiro. Eu estava passando por uma grande dificuldade financeira nesta nossa crise político/econômica interminável que me obrigou a ter um expediente de trabalho fora do normal para ter uma chance de sobrevivência. Por conseqüência, eu tinha menos tempo dedicado a lazer, que fazia com que minha parceira ficasse com “saudade” de mim, mesmo morando junto e trabalhando em forma de home office. Comentava que se sentia morando com um “room mate”. Entendo. Não concordo, porque eu estava disposto a passar por qualquer situação com o objetivo de eternizar nosso relacionamento e criar uma verdadeira família. Mas entendo.
Separamos. Depois, fiquei conjecturando sobre os motivos que, mesmo eu dando tudo de mim e fazendo todas as concessões possíveis na mais intensa lealdade imaginável, não trouxeram a felicidade tão buscada pela pessoa que eu amava.
Ao invés de eu deduzir a explicação mais fácil e óbvia, especialmente por uma pessoa do meu perfil, como: “mulher é tudo igual” ou “mulher nunca está satisfeita com nada”, fui mais a fundo nas possibilidades e fiquei assustado. Não em relação a mim ou à pessoa que estava comigo. Mas com a sociedade, como um todo.
Mesmo que ela não saiba, a única possibilidade racional que consigo imaginar é que, por conta de nossa atual percepção do mundo, através das mídias sociais, em que só vemos pessoas felizes, bem resolvidas e empolgantes, acabamos subindo as expectativas sobre como deveria ser nosso dia-a-dia. A todo o momento, vemos nossos contatos fazendo programas bacanas. Porém, temos dificuldade de imaginar que são apenas recortes específicos de suas vidas e muitas vezes relacionados varias pessoas diferentes, em ocasiões espaçadas. Também não vemos o período que estão “offline”, fazendo programas caseiros para economizar para um grande evento ou até trabalhando nos finais de semana, como eu fazia. Acabava imaginando que tinha alguma coisa de errada com nossa vida por não conseguir aproveitar o tempo.
Outro fenômeno interessante que percebi é que, por conta do acesso aos melhores momentos da vida de todos, acredito que a percepção sobre as qualidades essenciais para você “fechar contrato” com uma pessoa tenha se tornado praticamente impossível. Constantemente, a pessoa vê o parceiro do casal amigo sendo companheiro, outro sendo atencioso, outro sendo um grande pai, outro sendo um grande ajudante nas tarefas de casa, outro sendo extremamente social, outro sendo valente, outro sendo sensível, outro tendo um ótimo relacionamento com a família da parceira, outro sendo fiel, outro sendo romântico, outro sendo trabalhador, fica difícil você argumentar que uma só pessoa não pode ter todas essas características. Nos tempos de hoje, somos obrigados a reunir todas!
Temos que elencar as principais características que queremos ver em nosso par e avaliar se as outras serão de menor importância para “topar” o pacto da vida. Involuntariamente, queremos todas essas características que encontramos em diversos casais conhecidos e desejamos que nosso cônjuge tenha todos. Todos. Todos numa só pessoa. Impossível. Ou melhor, me arrisco a dizer que será impossível sermos felizes com a pessoa que escolhemos passar o restante de nossa vida ao lado. A não ser...
A não ser que sejamos muito bem resolvidos. Digo, você, consigo mesmo. E que saibamos que este fenômeno existe. Uma armadilha. Perigosa. Se não ficar atento, pode deixar a pessoa da sua vida “escapar”. Sem possibilidade de remendar. Mesmo que acredite em todos os deuses, universo conspirador e destino que quiser. Cuidado!
Devemos ver situações semelhantes nesses novos tempos. O pior é que muita gente vai acabar tirando as conclusões mais fáceis. Uma pena.
Depois de alguns dias pensando sobre isso, esbarrei num vídeo do TED – Ideas Worth Thinking, que aborda algumas questões psicológicas interessantes sobre o tema: